Silenciadas em nome de Deus

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA EM LARES CRISTÃOS: A DOR DISFARÇADA NA SUBMISSÃO

“Tudo interessa à fé cristã, e não apenas o compartimento religioso”1, afirma o teólogo brasileiro Leonardo Boff. Sua fala evidencia a necessidade da reflexão teológica ultrapassar fronteiras auto-impostas, eclesiasticamente forjadas, para ali, no mundo cotidiano e concreto da realidade, (re)pensar sua missão cristã. Afinal, se Deus está na vida humana, potencializando suas realizações e sustentando-a com sua presença amorosa, então é neste espaço da realidade que a Teologia deve também estar e atuar. Caso ignore a realidade na qual se encontra, a Teologia torna-se um instrumento de alienação, dor e morte, contabilizando muitas vítimas em seu percurso e deturpando a boa notícia do evangelho em algo perversamente opressor. 

Certos temas encontram guarida quase imediata nesta espúria deturpação da fé em Cristo. Com muita clareza, podemos apontar a violência contra a mulher como uma dessas temáticas que, vergonhosamente, tem sido invisibilizada em diversos setores evangélicos. Aliás, em muitas igrejas, o tema nem parece existir na realidade; não ocupa as pastorais ou pregações nem encontra espaço em discussões nas salas das Escolas Bíblicas Dominicais. Daí ser possível reconhecer que muitos cristãos vivem num universo fictício, desvinculado do mundo real, no qual sentem-se confortavelmente anestesiados para sequer conhecer a dura realidade de milhares de mulheres no Brasil que sofrem com a violência. E isso vai além: há silenciamentos impostos por líderes cristãos às mulheres vítimas da violência, sobretudo a doméstica, o que evidencia como a estrutura religiosa, em múltiplas ocasiões, tornou-se conivente com práticas desumanas.